O futebol africano não tinha muita relevância em Copas do Mundo até o ano de 1990. Até essa data, nenhuma seleção do continente havia chegado até as quartas-de-final em um mundial de seleções. Mesmo com a excelente geração de 1982, os resultados ainda não eram expressivos. Nascido em 20 de maio de 1952, em Yaoundé, capital camaronesa, Milla era um dos nomes que compunham a boa seleção de seu país em 1982, sendo essa a primeira participação dos camarões em Copas. O time vinha turbinado por uma geração que dominava o futebol de clubes no continente, com os craques do Canon Yaoundé ganhando a Liga dos Campeões da África em três ocasiões ( 1971, 1978, 1980 ). Com nomes como o lendário arqueiro N’Kono e o meia Theóphile Abega.

Quando Camarões chegou a sua primeira Copa, Milla já estava com 30 anos, ou seja, para o desporto profissional não era nenhum novato, embora, para toda aquela geração, o clima de novidade que provocavam na mídia e em seus adversários, a sensação era essa. Roger começou no futebol aos 13 anos (!!!) pelo Eclair de Douala, onde jogou até sua maioridade. Aos 18 se transferiu para Léopard de Douala, clube que realmente o projetou ao futebol em nível nacional, vencendo a primeira divisão camaronesa em 1972, 1973 e 1974, rivalizando com o gigantesco time do Canon que citamos acima. Logo após o tri-campeonato, Milla se transfere para outro clube de seu país o Tonnerre Yaoundé, clube que seria o último em seu país após um longo êxodo pela Europa. Camarões foi dividido em duas partes após a primeira guerra mundial, entre britânicos e franceses, então as relações do país com a França ainda eram muito presentes. Isso facilitou a saída de Milla para a França em 1977 com 25 anos.


Teria tudo para ser uma história óbvia de sucesso, um jovem talentoso, chegando na Europa para jogar futebol, mas não foi bem assim, não como Milla esperava. Algo muito importante para a carreira de Milla aconteceu em 1976, ele foi honrado com o título de Melhor Jogador da África, prêmio dado pela confederação africana. Era de se esperar que caísse como um meteoro na França, mas a realidade foi o modesto time do Valenciennes, onde embora mostrasse bom futebol e resultados, estava obviamente longe dos holofotes. Isso de certa forma, entristeceu Milla. Foram duas temporadas no clube até ter a chance de se transferir para o Monaco em 1979, onde as coisas começaram a melhorar, embora ainda não bem aproveitado, o craque mostrou bom futebol, e muito rapidamente, foi desejado por outro clube, o Bastia, em 1980, de forma que a passagem no Monaco, não durou sequer um ano.

Pelo Bastia, Milla se tornaria um ídolo. Mas o time ainda era uma equipe de menor expressão no futebol francês, que nessa época, também não chamava atenção no resto do continente europeu. Ou seja, mesmo que tendo chance como titular e podendo jogar com regularidade, seu nome ainda não ocupava o escalão principal do futebol, e assim foi seguindo até aquela primeira Copa do Mundo em 1982. E toda a vontade acumulada de um "novato""veterano", deve ter dado a Milla fôlego extra para dar tudo de , em seu máximo potencial e aparecer para o mundo como o bom jogador que sempre foi. E deu certo. O jogador ainda ficaria mais algum tempo no Bastia, mas após aquela copa, os olhares para ele e para a seleção de seu país, eram outros. Em 1981, Milla havia marcado o último gol que deu o título do Bastia sobre o então poderoso Saint-Étienne de Michel Platini, na Copa da França. O Título nacional fez de Milla um herói no Bastia.

Em 1984, um rebaixado Saint-Étienne, decidiu investir em Milla. Mesmo sendo campeã continental africana em 1984, lamentavelmente sua equipe não se classificou para a Copa de 1986. E talvez o desgosto tenha afetado o coração de Milla, que continuava jogando bem por clubes, mas sem o devido brilho e atenção que merecia. Passou entre 1986 e 1989 pelo Montpellier e seu último clube na França foi o JS Saint-Pierroise, onde ficou até o fim da Copa de 1990.

REDENÇÃO

Em 1990, Milla perdeu sua mãe, no mesmo ano que sua esposa estava grávida, isso levou o craque a um retiro, para repensar a vida e segundo muitos relatos, talvez pensasse em abandonar o futebol. Porém sua seleção estava mais uma vez classificada para o Mundial. Diz a história que a aceitação em quebrar o exílio e aceitar jogar a Copa, veio por intermédio do presidente de Camarões na época, Paul Biya, que era amigo pessoal de Milla. O pedido foi aceito e ele talvez não imaginasse que faria história. Caso não fosse ao mundial de 1990, talvez falássemos sobre Milla como um bom jogador africano que jogou na França, ou pelo seu título de melhor da África em 76, mas a história lhes resguardava esse capítulo especial.

Mais uma vez a seleção africana era a atual campeã continental, levando o título de 1988. Em 1982, camarões saiu invicto da Copa, com três empates em três jogos. Mais uma vez a curiosidade sobre aquela vibrante seleção era presente. Um Milla motivado, comemorava seus gols dançando, o time jogava sorrindo, embora mostrasse um futebol de muito vigor físico. Representavam a África com muita personalidade, e seu time ganhou o apelido de Leões indomáveis. A estreia na copa seria contra os atuais campeões, a Argentina, jogo de tabela certo? Só que não. Milla começou no banco, entrando só no fim do jogo, mas viu de camarote sua equipe vencer os campeões mundiais por 1 x 0, passando sobre o time de Maradona! O jogo seguinte era contra a Romênia de Hagi, e foi um show de Milla, que marcou os dois gols da vitória por 2 x 1 e vindo do banco!! Mesmo perdendo por 4 x 0 para a União Soviética, sua equipe passou para a fase eliminatória.

Ter a seleção nas oitavas de finais, contra a Colômbia do goleiro e figuraça Higuita, já seria algo inédito, porém, os mais letrados no futebol, já lembram desse lance, desse gol e dessa comemoração. Que lambança Higuita!! Nas quartas, a seleção inglesa finalmente conseguiu parar Camarões, mas não foi fácil!


Logo após a brilhante participação na Copa, Milla decidiu voltar ao seu país, para jogar pelo clube que o projetou para a Europa, o Tonnerre Yaoundé. Nem Milla, nem os camaroneses tinham muitas espectativas sobre o craque participar na próxima Copa, mas ele o fez, e foi não só o jogador mais velho a participar em uma Copa, então com 42 anos, como o mais velho a marcar um gol em copas.

O recorde de jogador mais velho a participar em Copas do Mundo, apenas foi quebrado em 2014, pelo goleiro colombiano Faryd Mondragón.