A atmosfera tinha perfeita simbiose entre Flamengo, a nação e o Maracanã com geral e capacidade para mais de 100 mil apaixonados. A bola passava de pé em pé, sempre bem tratada. Podia respirar fundo em faltas na entrada da área adversária, era meio gol para certo camisa 10.  Poucas vezes se reuniu tanto talento, sedução e eloquência numa equipe. Aquele vermelho & preto trouxe plasticidade e categoria de arrebatar, maltratar, de emoções épicas o coração. Na pele rubro-negra se escorria suor, sangue, como símbolos da raça, do amor e da paixão entre o time e sua torcida.  O Flamengo dos Shows, o FlaShow que tinha fibra e fazia vibrar, os insaciáveis Campeões do Rio de Janeiro, do Brasil, do Continente e do Mundo. O esquadrão de Raul, Leandro, Mozer, Júnior, Andrade, Adílio, Zico, Nunes & cia, jogava por música, virava poesia e se eternizava como a geração que trouxe para os campos de futebol o festivo carnaval de maravilhas dos brasileiros, fazendo do CR Flamengo definitivamente uma das culturas mais emblemáticas do Brasil.

"CRAQUE, O FLAMENGO FAZ EM CASA"
 
 
A conquista do terceiro Tricampeonato Carioca da história do Flamengo no final da década de 70, marcou também o começo da construção de uma geração que levaria o clube ao topo do futebol mundial, fazendo jus ao ditado “Craque, o Flamengo faz em casa”.  O técnico da Seleção Brasileira de 1978, Cláudio Coutinho, começou naquele período a extraordinária transição. A geração de Cantarele, Toninho, Rondinelli, Manguito, Reinaldo e Cláudio Adão foi abrindo espaço para os talentosos Leandro, Júnior, Andrade, Adílio, Zico, Tita, dentre outros destaques. Além disso, naquele período, de títulos estaduais e uma invencibilidade de 52 jogos, já contando com os jovens, o time ainda fez bonito na Europa e conquistou troféus de prestígio como o Ramon de Carranza e o Palma de Mallorca, ambos na Espanha. Experiência que serviu para os desafios internacionais que o Flamengo viria a enfrentar.

O BRASIL EM VERMELHO E PRETO
 
As perspectivas eram as melhores no começo de 1980. A entrosada equipe rubro-negra Tricampeã Carioca (1978-79-79*) estava reforçada com os talentos da base, deixando o Flamengo cada vez mais forte para buscar seu primeiro título do Campeonato Brasileiro. Algo demonstrado desde o início, em dois grandes duelos na primeira fase: dia 24 de fevereiro o Flamengo venceu o Santos com gol de Zico por 1 a 0 em São Paulo e uma semana depois superou o Inter pelo mesmo placar (Zico de novo) no Maracanã. Surpreendido pelo Botafogo da Paraíba na sequência, o Rubro-Negro alcançaria 5 vitórias e outros 3 empates, terminando em segundo dos sete classificados. Pela segunda fase, se no dia 06 de abril não saiu do zero a zero diante do Santa Cruz fora, uma semana depois o Flamengo despejou meia dúzia (6x2) no Palmeiras, em um Maracanã com 70 mil pessoas, gols de Tita (2), Zico (2), Toninho e Nunes. No embalo da equipe a nação empurrou na volta contra o Santa (2x1) e contra o Bangu (2 a 1 e 3 a 0). Chegava a Terceira Fase e só os melhores de cada grupo passavam. Aplicando 3 a 0 na Desportiva/ES com três gols de Zico e empatando com a Ponte Preta (1x1) com gol de Nunes, o Flamengo enfrentou o Santos por uma vaga nas Semifinais. Mais de 100 mil pessoas lotaram o Maracanã e apreciaram mais um recital de Zico, autor dos 2 a 0, dia 18 de maio. Na entrada das finais o adversário era a boa equipe do Coritiba, que havia superando Grêmio e Botafogo. Mas tendo mais uma vez Zico inspirado, o Flamengo despachou o Coxa: 2x0 no Couto Pereira (gols de Zico) e de virada 4x3 no Maracanã, gols de Nunes (2x), Carlos Alberto e Anselmo.

Faltava pouco para a afirmação nacional, e a decisão não seria nada fácil contra uma equipe de qualidade equivalente a rubro-negra. A perda da final de 1977 no Mineirão, fez do Atlético um time mais experiente. O esquadrão mineiro chegava à decisão deixando para trás Vasco, São Paulo, Fluminense e o Internacional (campeão invicto de 79), nas Semifinais. No poleiro do Tricampeão Mineiro (1978-79-80) nomes como João Leite, Luizinho, Jorge Valença, Chicão, Cerezo, Palhinha, Éder e o genial Reinaldo. O duelo não era só nos gramados, passavam também pelas arquibancadas, com as maravilhosas torcidas apaixonadas. No Mineirão mais de 90 mil pessoas, dia 28 de maio, a massa atleticana ecoava Galo, Galo, Galo... Com Reinaldo fazendo o gol da vitória atleticana aos 9’ do segundo tempo, dando a vantagem do empate aos mineiros no Rio de Janeiro.
 
 
A resposta no Maracanã, dia 01 de junho, veio ao som de quase 150 mil rubro-negros, em uma das maiores finais da história do Campeonato Brasileiro. Talento, entrega, suor, polemica e muita, muitíssima emoção! Se lançando a frente desde o inicio o Galo levou perigo com Palhinha, mas não demorou para o Flamengo reagir. Aos 7’, Zico deu uma tacada de mestre para Nunes vencer a zaga atleticana e com um toquinho desviar de João leite, guardando a bola no fundo do gol (1x0)! A festa, porém, durou apenas um minuto, Reinaldo recebeu na área e empatou. O jogo ficava nervoso ao passar do tempo, disputas fortes, chances para os dois lados e mais uma vez o Maraca iria tremer antes do encerrar inicial: aos 44’, João Leite e Orlando não conseguem afastar o perigo, Júnior na sobra tenta e a defesa atleticana rebate, a bola vai buscar o artilheiro do campeonato, Zico, que inclina o corpo e fuzila as redes atleticanas fazendo seu 21º gol (2x1)!  Precisando de um empate para cantar de galo, o Atlético tem a mesma postura ofensiva após o intervalo, mas Reinaldo sente uma distensão muscular, deixando os atleticanos apreensivos, as duas substituições possíveis já tinham sido feitas. A torcida rubro-negra gritava “bichado”, “bichado”. Mas teve de engoliu a seco aos 21’. Reinaldo mesmo mancando empatou de novo, calando o Maracanã.
 

Na empolgação atleticana, Coutinho tira a cadência de Carpegianni e coloca pegada no meio-campo com Adílio. O Flamengo passa a controlar. O Atlético tenta um ataque aos 24’, o bandeira marca impedimento de Reinaldo, o jogador reclama um pouco acima do tom, José de Assis de Aragão chama a responsabilidade e expulsa o craque, causando a revolta dos atleticanos. A vantagem numérica deu ao Flamengo ainda mais imposição, que passava a pressionar enquanto o Atlético se fechava. Perto do fim, os ares eram de aflição para os dois lados. Até que, aos 37’, na diagonal da área atleticana, sem ângulo, Nunes passa por Silvestre e acha o único caminho das redes de João Leite. Gol do Flamengo! Gol do Título! Nem os nervos a flor da pele dos atleticanos tendo ainda Palhinha e Chicão expulsos, tirava mais a Taça de Ouro do Mengo. O Flamengo conquistava seu primeiro Campeão Brasileiro!

Alguns meses depois, em giro pela Europa, o Flamengo continuou empilhando taças e ganhando experiência para os grandes desafios fora do Brasil.


O FLAMENGO “OVERLAPING” DE COUTINHO

 
Trazendo ao Brasil a chamada “Teoria do Futebol”, desenvolvida nos centros de estudos da Europa, o técnico Cláudio Coutinho ganharia admiração no futebol brasileiro. Apesar de certa resistência no início, chegando a ser tratado como piada. As suas inovações, contudo, chegariam a Seleção Brasileira, na polemica Copa do Mundo de 1978. Mas seria mesmo no retorno ao Flamengo, que o estudioso Coutinho encontraria condições ideias de obter seus maiores sucessos, tendo no goleiro Raul, os zagueiros Mozer e Marinho, e o volante Andrade a segurança; para fazer do setor de meio-campo regido pelo genial Zico, o arco & flecha, um dos melhores jogadores da história, a base de toda a criação de um futebol fantástico, reforçando com a presença dos laterais-alas habilidosos Leandro e Junior, e dos meias-atacantes criativos, Lico e Tita, além de Nunes na definição. Equipe que ainda criou características próprias, como o meio toque na bola, e toda a excepcional técnica e habilidade desenvolvida.


Seus treinos aplicavam o chamado Overlaping (a sobreposição), que em tese seria o deslocamento dos jogadores sem a bola, para atrair a marcação. Tudo feito com velocidade e pegada, o treinador também era um preparador físico. As estratégias de jogadas com um ponto futuro, movimentos de ultrapassagem dos laterais pelos ponteiros, para alcançar situações surpresas a linha de fundo na área adversária, além da transição ofensiva com a bola e sem ela, foi um importante legado no Brasil. O país que ainda estava com avanços tímidos dos laterais e a maior parte dos pontas jogando aberto nas extremas, facilitando marcações. Com alas e meias habilidosos, Coutinho pôde enfim fazer suas “teorias” ou “estrangeirismos”, calando os críticos. Ensinamentos continuados por Carpegiani, que tocou o barco após a perda do treinador. “Foi uma mistura mágica, liderada pelo Carpegianni, um técnico muito inteligente. A equipe tinha a técnica de Zico, Leandro e Júnior. O oportunismo de Nunes. A juventude do Mozer, Adílio e Andrade, além da minha experiência, do Lico e do Marinho. O time parecia impor um ritmo forte, mas quem corria era a bola. Todos tinham muita confiança” afirmou o goleiro Raul.
 


NA TÉCNICA E RAÇA, A CONQUISTA DA AMÉRICA
 
Após conquistar o Rio de Janeiro e o Brasil, chegava a vez do Flamengo lutar em busca do trono da América do Sul. Trajetória que se mostrou dificílima logo na Primeira Fase. Na estreia, dia 03 de julho, o Flamengo reencontrou o Atlético MG de Luizinho, Cerezo, Reinaldo, Éder & cia, e começou perdendo por 2x0, mas com garra foi buscar o empate por 2x2 através de Nunes e Marinho, lá no Mineirão. O mesmo placar seria repetido no Maracanã, gols rubro-negros feitos por Nunes e Tita. Nesse intervalo a técnica do esquadrão rubro-negro ainda seria pesado no continente ao massacrar por 5x2 (2 gols de Zico e 2 de Nunes) e 4x2 (com Zico indo três vezes às redes) o vice-campeão paraguaio, o Cerro Porteño de R. Fernández, D. Figueredo e A. Florentin. Com empates (1x1 e 0x0) frente ao temível campeão paraguaio, do Olímpia, apesar de ter sido melhor nas partidas, o clube da gávea ficou em igualdade de pontos com o Galo mineiro, levando as equipes para um jogo extra. No Serra Dourada, em Goiânia, dia 09 de agosto, o desempate foi marcado por uma grande confusão, com os atleticanos caindo em guerra de nervos e tendo cinco jogadores (Éder, Reinaldo, Chicão, Palhinha e Cerezo) expulsos pelo árbitro José Roberto Wright. A partida foi encerrada ainda aos 37’ do primeiro tempo, e o Flamengo seguiu na competição.

Arrasadora foi a equipe rubro-negra no triangular das Semifinais. Jogando fora de casa o Flamengo mostrou não ser só um time de Maracanã e foi superior aos rivais. Com gol de Nunes veio a vitória frente ao Deportivo Cali do craque Willington Ortiz, na Colômbia. Baroninho e Adílio assinalaram a vitória na sempre complicada altitude da Bolívia frente ao Wilstermann. Depois ocorrem os jogos no Maracanã e o Flamengo liquidou de vez os adversários com shows de jogadas e gols: 3 a 0 (dois de Zico) pra cima do Deportivo Cali e 4 a 1 de virada (gols de Nunes, Adílio, Anselmo e Chiquinho) frente aos Campeões Bolivianos. Garantindo assim passagem à final. Do outro lado da chave, o chileno Cobreloa superou de forma invicta com 3 vitórias e 1 empate, ninguém menos que os temíveis uruguaios do Nacional e do Peñarol. Os Naranjas (como são conhecidos) eram os atuais campeões Chilenos e tinha como destaque o zagueiro Mário Solto, os meias Héctor Puebla e Victor Merelle, na frente o atacante uruguaio Jorge L. Siviero. A equipe era forte e chegaria a decisão da Libertadores em dois anos consecutivos.


A BATALHA PELA LIBERTADORES
 

Na primeira partida, dia 13 de novembro, em um Maracanã com 93 mil pessoas, o Flamengo contou com o talento de Zico (aos 11’, após tabelar com Adílio e receber para abrir o placar; e aos 30’, assinalando penalidade máxima), para vencer o Cobreloa por 2 a 1. Uma semana depois, pressionado pelo clima hostil, truculência da polícia de um país que vivia sob uma sangrenta ditadura militar, liderada pelo general Augusto Pinochet, no estádio de Santiago com mais de 61 mil torcedores, o Flamengo cedeu ao jogo agressivo dos chilenos e saiu das suas características ao tentar jogar pelo empate, sendo derrotado por 1x0.

A finalíssima ocorreu dia 23 de novembro, no campo neutro do emblemático estádio Centenário de Montevidéu. Além da inteligência emocional, o Flamengo teve de aliar valentia as suas virtudes técnicas em prol dessa apoteose.  Os chilenos estavam dispostos a fazer uma guerra campal, abusando de jogadas desleais, deixando o jogo truncado no meio-campo. Sem se acovardar o Flamengo mostrou ser um time de fibra. O rubro-negro respondia na base da raça de Mozer, Júnior e Andrade, enquanto a qualidade para furar o bloqueio veio com Zico. Aos 18’ do primeiro tempo, após bate e rebate, a bola sobra a meia altura, o galinho se inclina e arremata fazendo 1x0, Mengo! Após o intervalo, passando a envolver o adversário no seu toque de bola, cansando e maltratando no olé, o Flamengo tomou controle das ações. Após o goleiro adversário tocar com a mão na bola fora da área, impedindo ataque de Adílio, a infração foi marcada. Na entrada da área, adivinha quem vai bater? O camisa 10 da gávea se prepara, observa, e coloca com maestria a redonda no canto esquerdo do goleiro Oscar Wirth, intacto, a observar o golaço! Gol de Zico! Gol do Mengo! O Flamengo já vencia no campo, mas faltava um acerto de contas. “Vai lá e dá um muro no Mário Solto” foi a ordem dada por Carpegianni, cumprida à risca pelo centroavante Anselmo. Assim, na bola e na “porrada”, em sua primeira participação continental, o Flamengo conquistava a Taça Libertadores da América! Zico foi o artilheiro (11 gols). Carimbado o passaporte para Tóquio.
 

Apenas treze dias depois (06/12), há uma semana da viagem para o Japão, o Flamengo estava decidindo o Campeonato Carioca. O time já havia vencido a Taça Guanabara e vingado os 6x0 no Botafogo. Na final toda a equipe jogaria pela memória de seu treinador. Com gols de Adílio e Nunes ainda no primeiro tempo, o Flamengo venceu o Vasco por 2 a 1 e levantou mais uma taça, numa ocasião entre alegria e saudade. Mais de 100 mil pessoas gritaram o nome de Coutinho, criador daquele time, que havia morrido em novembro ao praticar mergulho nas encostas do Rio. Com sentimento de luto e mais uma faixa no peito, o Flamengo partiu para o outro lado do Mundo para fazer história.

MAIS QUE DONOS DO MUNDO
 

Por desrespeito ou pura ignorância do que iriam enfrentar, os ingleses ficaram rindo ao ver a corrente formada pelos jogadores do Flamengo (Raul, Leandro, Marinho, Mozer e Júnior; Adílio, Andrade e Zico; Tita, Lico e Nunes) no túnel de entrada do estádio Nacional de Tóquio, dia 13 de dezembro de 1981. A esnobe reação teria sido motivada pela grande equipe que era o Liverpool, uma seleção britânica com Hansen, Thompson, Neal, Souness, Ray Kennedy, Dalglish e outras feras. O time já vinha de três reformulações de gerações fantásticas em seis conquistas de Campeonato Inglês, três Liga dos Campeões da Europa, e outras taças continentais em cinco anos, tendo no título Europeu daquele ano passado por Bayern München e Real Madrid. Mas aquilo acabou sendo combustível ao Flamengo, vestido com camisas brancas e mangas rubro-negras, para uma apresentação impecável, desfilando um talento celestial na terra do sol nascente.
 

Sedentos pelo triunfo a eternizar uma das mais brilhantes gerações do futebol, desde os primeiros minutos o Flamengo envolveu o gigante inglês em um toque de bola refinado, com malícia, categoria e habilidade. Os 62 mil japoneses no estádio arregalaram os olhos logo aos 12’. Zico observa o avanço de Nunes, espera o momento certo e faz um lançamento milimétrico por cima da zaga inglesa, em velocidade o “artilheiro das decisões” só desvia a bola do desesperado goleiro Grobellar, e a redonda vai descansar nas redes, 1x0! Poucas vezes se reuniu em uma equipe tanto talento, sedução e eloquência com a bola. Só mesmo parando com faltas, McDermott em Tita na entrada da área aos 33’. Mal negocio! Zico cobrou firme, a bola se desprendeu das mãos de Grobellar, Tita tentou, mas foi Adílio quem marcou, 2x0!
 

O tempo passava e o Flamengo tratou de deixar os europeus na roda, dando o golpe que tirou qualquer esbouço de reação aos 41’. Adílio inicia a jogada, se livra da marcação de Lawrenson e toca para Zico, que quebra a linha de defesa adversária com mais um passe fenomenal. A bola vai a feição do avanço de Nunes, que penetra na área e arremata cruzado no canto direito do goleiro, bola nas redes. Flamengo 3x0! O todo poderoso Liverpool estava destruído em 45 minutos, naquela que é, porque não dizer, a maior apresentação já feita por um clube sul-americano em Tóquio. Sem se esforçar na segunda parte, o melhor time do planeta poderia ter feito mais, mas só precisou tocar de pé em pé e esperar o tempo passar até a consagração: Flamengo Campeão do Mundo! Só mesmo um time como aquele, para em meio ao turbilhão de emoções, conquistar três títulos em apenas 21 dias.
 


FLA DAS VIRADAS E DOS ESPETÁCULOS
 
Após conquistar tudo que podia, o Flamengo tornou-se o time a ser batido no Campeonato Brasileiro de 1982.  A competição acabou sendo emocionante e das mais difícil naqueles anos dourados do clube. Era a face do Flamengo vira-vira ou time dos sete fôlegos. A torcida se acostumaria a sentir o coração apertado durante boa parte dos jogos, para no final explodir de alegria. Desde a primeira fase, apesar de não sofrer derrotas, o Flamengo necessitava de sentir o golpe primeiro, para depois acordar e levar os adversários à lona. Saindo atrás do poderoso São Paulo e da boa equipe do Náutico, o Rubro-negro virou ambos os placares de forma espetacular: 3x2 e 4x3, respectivamente. Sem dificuldades diante do Treze (5x0 no Maraca com Zico fazendo fila, 3x1 lá) e da Ferroviária (3x0 e 2x1), o melhor jogo ocorreria na última rodada, no reencontro com o São Paulo de Waldir Peres, Oscar, Dario Pereyra, Renato, Mário Sérgio, Serginho & cia, no Morumbi. Craques da Seleção Brasileira se enfrentando, estádio lotado e o tricolor abriu o placar com Renato "pé murcho". O Flamengo reagiu como uma avalanche e virou o jogo para 4x1! Só não podia relaxar para a máquina do SP, que aproveitou para encostar, mas o placar foi favorável ao time da gávea, 4x3. A reunião na fase superior foi titânica. Após empatar na primeira (contra o Corinthians, com golaço de Zico, limpou a zaga antes de assinalar), o Flamengo encontrou a vitória diante do Galo por 2x1, no Maracanã. A sequencia, porém, teve empate e uma derrota. A reação veio lá no Sul, diante do Internacional, após estar perdendo, o Flamengo buscou outra virada por 3 a 2. Por fim, veio o triunfo de classificação frente ao Corinthians de Zenon, Casagrande & cia, por 2 a 0.
 
 
Duelo dificílimo com o Sport pela Fase Final. Após vencer por 2x0 no Rio de Janeiro, o Flamengo sofreu pra segurar 1x2 em Pernambuco. Chegando nas quartas de finais, na primeira partida no Maracanã, o Mengo mais uma vez começou perdendo, agora pro Santos (0x1). A reação no segundo tempo com gols de Tita e Marinho (já no final do jogo, aos 44’), levou a torcida ao êxtase. “Adoro samba e, quando escuto a galera cantando nas arquibancadas, sinto arrepios, me entrego de corpo e alma à disputa. Acho que, sem ela, não teríamos conseguido tantas viradas” dizia o lateral Júnior. No Morumbi, logo aos 3’ de jogo o Santos fez 1x0, mas Zico foi buscar o empate colocando o Mengo na fase seguinte. No confronto diante da forte equipe do Guarani de Careca nas Semifinais, o Flamengo não quis saber de sair atrás no placar: com 20’ no Maracanã, o time já vencia por 2x0, gols de Zico e Peu. O Bugre diminui, mas a vitória rubro negra foi consumada. A volta no Brinco de Ouro foi tensa, o Guarani fez com Jorge Mendonça no comecinho. O Flamengo só reverteu a peleja com ele, claro, Zico! Aos 22’ da fase inicial, e aos 3’ e 22’ do segundo tempo, 3x2! De forma incrível na competição o Flamengo por nove vezes esteve atrás e foi buscar resultado. Carpegianni dizia: “É o espirito de luta da equipe toda vez que estávamos em desvantagem no marcador. Os jogadores conseguem virar porque não se perdem em campo, são maduros”.

Do outro lado da chave, grande parte dos brasileiros esperava uma final entre os clubes de maior torcida do Brasil, seria o encontro de Sócrates x Zico. Mas o copeiro Grêmio não foi avisado e venceu os dois jogos (2x1 e 3x1) frente ao Corinthians. O Tricolor dos Pampas tinha Leão, De Léon, P. Isidoro, Baltazar, Renato Gaúcho e outras feras, e se notabilizava como terror dos times do eixo RJ-SP, sobretudo cariocas, tendo eliminado Vasco e Fluminense. A decisão só seria resolvida em três jogos, ou melhor, em três Batalhas. Não podia ser diferente,  pois em campo o Campeão do Mundo e da Libertadores de 1981 (além do Brasil em 80) enfrentando o atual campeão do Brasil e futuro campeão da Libertadores/Mundo do ano seguinte.

 

Jogo nervoso no primeiro encontro no Maracanã (18/04). Somente aos 37 do segundo tempo, Tonhão abriu o placar para o Grêmio no mando rubro-negra com 138 mil pessoas, resultado que deixaria os gaúchos perto do título. Resolvido? Não! Aquele Flamengo maltratava, arrebatava e fazia explodir de emoção o coração em cima da hora, aos 44’, Zico – sempre ele – tirou um marcado e fuzilou o gol de Leão, 1x1! Segunda partida em Porto Alegre dia 21 de abril, jogo truncado e pegado só podia terminar em um 0x0. Foi necessário o terceiro jogo, pela melhor campanha o tricolor dos pampas tinha a vantagem de jogar em casa.
 
 
No dia 25 de abril de 1982, o Olímpico recebeu um público de 62 mil pessoas, em um domingo ensolarado. Cada centímetro de espaço no campo foi disputado, fortes divididas a todo momento, jogo duro, com o Grêmio treinado por Ênio Andrade marcando sob pressão as saídas de bola rubro-negras, e o goleiro Raul dando chutões, para desespero de Leandro, que via na sua saída de jogo o desafogo. Quando finalmente o lateral recebeu a bola, ela veio alta e com força. Sem problemas, Leandro matou no peito, deu um drible no adversário, tabelou, chegou a linha de fundo e quase o gol saiu. Na volta, ele gritou pro Raul: “Véio, eu jogo pra caralho”! Assim era o Flamengo, que tinha mais classe e na confiança decifrou o caminho do gol, logo aos 10 minutos, na genialidade de Zico, que deixou em condições o danado João de Deus. Nunes arrematou forte de primeira, vencendo  Leão, Flamengo 1x0! No decorrer do jogo a porrada comeu solta, polemicas dentro da área, chances para os dois lados, com os times se digladiando. Sabendo sofrer até o ultimo minuto do jogo, o Flamengo alçou mais uma Taça de Ouro! Zico, o galinho, novamente foi o artilheiro com 21 gols e Bola de Ouro da competição. Flamengo, Flamengo, Tua Glória é Lutar!

Na Copa do Mundo de 1982, na Espanha, os flamenguistas Leandro, Júnior e Zico eram titulares da Seleção Brasileira, que encantou o mundo com o futebol arte. Mas a equipe canarinho acabou eliminada na Tragédia de Sarriá pela fortíssima Itália, que seria a Campeã. Alguns meses depois, no Triangular Final do Carioca, outra taça escorregou pelas mãos rubro-negras, assim como havia ocorrido inexplicavelmente na derrota para o Peñarol-URU, no Maracanã, pelas semifinais da Libertadores, dando adeus ao sonho do Bi da América. A necessidade de uma pequena remodelação foi sentida, para reconquistar a Taça de Ouro.

VENCER, VENCER, VENCER...
 
 
Muitas mudanças ocorreriam no plantel rubro-negro para buscar o terceiro título do Campeonato Brasileiro, o Bicampeonato consecutivo. A reforma foi principalmente ofensiva, antes e durante a disputa de 1983. Foram emprestados o meia Tita ao Grêmio e centroavante Nunes ao Botafogo, enquanto o atacante Peu foi para o Athletico-PR. A reposição ocorreu com o ponta Robertino (vindo do Fluminense) e o centroavante Baltazar (revelado no Grêmio e de rápida passagem no Palmeiras). O Flamengo demorou a entrosar e sentia as mudanças nos primeiros jogos, passando a cansar mais rápido e perder velocidade na transição. Apesar de vencer o Santos por 2x0 na estreia (23/01), acabou tendo empates enfadonhos e dificuldade para vencer o Paysandu (3x2). O show tinha de continuar, a solução foi buscada nas categorias de base, com jovens velozes e habilidosos, o ponta-direita Élder e o ponta-esquerda Júlio César Barbosa. Agora se o time cansasse, a vitalidade entrava. Ainda foram ganhando posição Figueiredo na zaga e Vitor na contenção. A base de 1980-82 se mantinha, mas Mozer, Andrade e Lico já não eram titulares absolutos. A sequência do time foi com goleadas no Moto Clube (5x1) e Rio Negro (7x1), além de vencer outra vez o Paysandu. Foram cinco vitórias e dois empates, apesar de uma derrota para o Santos custar a liderança do grupo. Na segunda fase o Palmeiras dificultou, mas pouco influenciou, o futebol bem jogado e dinâmico voltava, a equipe obteve a classificação tranquila à fase final com vitórias sobre Tiradentes (3x1 e 2x0), Americano (3x0), e outros 3 empates. Sendo derrotado uma única vez no quadrangular da fase final, o Flamengo soube mostrar sua força no Maracanã vencendo Goiás (2x0), massacrando o Corinthians (5x1) e abalando o temível Guarani (2x0), obtendo o 1º lugar.

Pelas quartas de finais veio o emblemático Clássico dos Milhões. Na primeira partida, dia 05 de maio, com mais de 111 mil pessoas no Maracanã, com gols de Adílio e Mozer o Flamengo obteve a vantagem por 2x1 sobre o Vasco de Roberto Dinamite, Geovani & cia. Três dias depois, o Cruz-Maltino reagiu logo no início do jogo de volta com Elói, mas o Mengo foi buscar a classificação com Zico, aos 44’ do segundo tempo, perante 125 mil pessoas no Maracanã. Crescer mais uma vez em momentos decisivos era a mística do Flamengo, um time que já voltava a ter seu refinado meio toque na bola, foi assim diante do Athlético PR nas semifinais. O Flamengo abateu os paranaenses por 3x0 no Maraca, e na volta pôde até perder por 2 a 0. O adversário da final seria o mesmo da estreia, que se não tinha a qualidade do Atlético MG ao qual superou nas semifinais, o Santos do técnico Formiga contava com Joãozinho, Márcio Santos, P. Isidoro, João Paulo, além de Pita e o artilheiro do campeonato Serginho Chulapa, autores dos gols no Morumbi, para mostrar ser tão combatente quanto, vencendo por 2 a 1 na primeira partida da decisão (22/05), tendo chances até para um resultado maior.

 
 
Jogar por uma reação importante, contando com uma torcida pulsante a gritar em plenos pulmões para os jogadores deixarem o suor e o sangue no campo, isso era o habitat rubro-negro. No dia 29 de maio de 1983, o Maracanã foi abarrotado com mais de 155 mil pessoas exprimidas a gritar “Flamengo, Flamengo, Flamengo”, foi o maior público da história dos Brasileiros. Para fazer concebida a verdade musical “Flamengo joga amanhã eu vou pra lá, vai haver mais um baile no Maracanã”! Zico pedia luta e força aos companheiros, quanto apitou Arnaldo César o iniciar do jogo. Antes mesmo do primeiro minuto, Vitor lançou, Júlio César desceu pela ponta e fez um carnaval em cima de Toninho, antes de cruzar. Baltazar bateu, a zaga tirou, Júnior pegou o rebote e Marolla defendeu, a bola então procura os pés dele, Zico, aos 50 segundos, 1x0 ! O jogo seguiu aberto, ataques para os dois lados. Os santistas chegaram a reclamar de um pênalti, que virou obstrução na área, e passaram a ter mais pressão. Mas o Flamengo soube responder, veio a falta para o rubro-negro aos 39’. Zico cobrou preciso no primeiro pau, Leandro se antecipou e cabeceou certeiro, 2x0! A segunda etapa se inicia com o Santos buscando um gol para forçar a prorrogação, o Flamengo atacava de forma mais tranquila. O tempo passava e nada da rede balançar. Se encaminhando para o fim e a apreensão crescia. O relógio já assinalava 43’, a torcida rubro-negra que já gritava é Campeão, ainda veria Robertinho fazer boa jogada e cruzar, bola na medida para Adílio subir, cabecear e demolir o valente Santos em 3 a 0. Flamengo Tricampeão Brasileiro em mais um baile no Maracanã! A conquista consolidou a supremacia rubro-negra no futebol nacional, era o Terceiro Titulo Brasileiro em quatro anos.
 

FOI UM MAIOR PRAZER, VÊ-LO BRILHAR
 
Aquele Bicampeonato Brasileiro, o terceiro da história rubro-negra, também marcou o epílogo da equipe. Sendo o toque de cisnes do mais forte esquadrão do futebol brasileiro depois do Santos de Pelé & cia. Após a conquista veio a despedida de Zico, que foi jogar na Udinese/ITÁ. Só se podia cantarolar “E agora como é que eu fico nas tardes de domingo sem Zico no Maracanã?”... O time até continuou forte, mas perdeu o brilho e caiu nas competições. Naquela década ainda viriam mais conquistas importantes, inclusive, com alguns daqueles jogadores já mais velhos, além de outra renovação na base, foi um Falshow parte II. Mas foi aquela geração da Gávea entre 1980 a 83, que melhor encantou, vibrou e mais fez valer o sentimento do flamenguista. Jogadas, toques na bola e gols, que foram verdadeiros espetáculos, como poucas vezes se viu na história do futebol.
 
 

CONQUISTAS & CAMPANHAS

Mundial Interclubes 1981
Copa Libertadores da América 1981
Campeonato Brasileiro 1980.1982.1983.
Campeonato Carioca 1981.
- Entre outras taças internacionais como o Torneio Ramon de Carranza (na Espanha) 1980, Copa Punta del Este (no Uruguai) 1981 e o Quadrangular de Napoles (na Itália) 1981.

OS FEITOS HISTÓRICOS & LEGADO

- A geração rubro-negra conquistou tudo que pôde na época:
Campeonato Carioca, Campeonato Brasileiro, Copa Libertadores e a Copa Intercontinental.
- Foram campeões Carioca, do Continente e do Mundo em apenas 21 dias, e ainda conquistaram três Campeonatos Brasileiros em 4 anos.
- A equipe símbolo do futebol arte da geração 80 do futebol brasileiro.
- O FlaShow foi a equipe que trouxe ao Brasil uma nova forma de jogar. Através do Overlaping faziam o chamado meio toque na bola, com muita técnica, dinâmica e ofensividade.
- Na decisão da Copa Intercontinental, o Flamengo fez o mais espetacular show de uma equipe sul-americana frente a um esquadrão Europeu no Japão (a partir de 1980 a competição passou a ser disputada lá).