Naquele ano o scratch brasileiro fez encher o coração da sua gente, pondo na alma do torcedor a vibração incontida dos momentos dramáticos e inesquecíveis pela conquista do Sul-Americano de 1919. As façanhas do quadro brasileiro correram mundo, perpetuando-se nos anais esportivos como marco de glórias. O povo, tratado como bicho pelos governantes, viu na vitória do futebol de sua seleção uma representatividade triunfal. Quanta alegria, quanto entusiasmo, que jamais serão esquecidos pelos amantes da bola.
Formada de modo geral por uma elite a concentrar todo o poder (política de oligarquias), uma classe média operaria urbana com imigrantes europeus e japoneses, além dos sertanejos (de maiorias miseráveis e esfomeados), a sociedade brasileira vivenciava um ambiente marcado por injustiças e desigualdades nas primeiras décadas do século XX. Se por um lado o fim da primeira Guerra causou a desordem no mercado mundial e com o ciclo do café o Brasil fazia seu avanço econômico, por outro crescia a marginalização dos indivíduos, quase sempre tratados como “bichos”. Até mesmo o esporte se mostrava como elemento de divisões – ironicamente hoje visto como objeto de integração social. Enquanto a elite aristocrata jogava xadrez, praticava Remo em belas lagoas, ou mesmo o football, a classe operaria, principalmente o negro e analfabeto, eram escassos de qualquer direito, inclusive sem o voto na República.  Nesse espaço de tensões e contradições é difícil imaginar que se possa encontrar alguma identidade nacional, mas foi o que ocorreu em 1919. Naquele ano, ao qual no céu do Brasil se pôde observar a comprovação da teoria da relatividade de Albert Einstein e nas águas do país os rapazes praticavam o Remo, certamente ainda o principal esporte brasileiro, impulsionado pelo Rio de Janeiro, foi no solo que o país tupiniquim teria um evento a mudar parte das noções sociais e encontrar muita da própria identidade com heróis de fibra e talento, quando o Brasil abrigou e se consagrou na apoteótica disputa do Sul-Americano de 1919.


UMA EXCEPCIONAL ORGANIZAÇÃO
 
Com a preocupação dos governantes em mostrar uma forte imagem do país, a mobilização para a organização do Campeonato Sul-Americano no Brasil, já no ano de 1918, havia sido enorme. A epidemia mundial de gripe espanhola, porém, acabou adiando a terceira edição da história do evento. Mais de 50 milhões de pessoas no mundo foram vitimadas, no Brasil matando mais de 35 mil, inclusive o presidente recém-eleito Rodrigues Alves. A cidade do Rio de Janeiro, então capital federal, foi bastante atingida. O adiamento do torneio ainda causou uma problemática para a CBD, já que a entidade tinha adiantado o pagamento dos jogadores de São Paulo pela participação. O dinheiro foi pedido de volta, mas alguns dos atletas já teriam gastado com roupas, presentes e afins. A entidade quase chegou a punir os jogadores, entre os quais estava Friedenreich, Neco e Amílcar, com a proibição de participarem do próximo Sul-Americano. Muitos foram ainda hostilizados na chegada a capital federal – tratamento que mudou quando a bola passou a rolar.
 
 
Amenizado o grande surto da gripe espanhola, a terceira edição do Sul-Americano de Seleções pôde enfim ser sediado no Brasil, na cidade do Rio de Janeiro, no ano de 1919. Com a mobilização há mais tempo, o país pôde se organizar de forma excepcional. Pela primeira vez o Brasil abrigaria um torneio de nível internacional, mais do que vencer existia a preocupação do país demonstrar ter plenas condições de organizar uma competição dessa magnitude, sendo um dos grandes momentos o dia 11 de maio de 1919, com a cerimônia de inauguração do Estádio das Laranjeiras, campo do Fluminense. Considerado na época o maior estádio da América Latina, com capacidade para 25 mil espectadores, contou com a presença de personalidades do esporte, das artes e da política, como o vice, que virou presidente, Delfim Moreira.

Além da parte estrutural, o Brasil cuidou de ter uma comissão técnica formada por Arnaldo Silveira (capitão), Amílcar Barbuy, Mario Pollo, Affonso de Castro e Ferreira Vianna Netto. Foram decididos com melhor vigor a convocação dos jogadores e os horários de treinos marcados com antecedência. Tudo feito da melhor maneira possível pelo que se tem notícia. Apesar de uma polêmica entrevista de Sylvio Lagreca, dada a Gazeta Esportiva, ao qual chegou a afirmar que os jogadores seriam escalados por indicações politicas e não por suas qualidades técnicas. Com jogadores e membros da comissão técnica desmentindo dois dias depois e apaziguando a situação, sem deixar o caso ganhar grandes proporções.
Naquele tempo de pouco informação das mídias (sem TVs ou Rádios), e alta taxa de analfabetismo, as pessoas demoraram a assimilar a ideia daquele acontecimento. Somente aos poucos, todos foram se dando conta do grande evento, conforme foram desembarcando no caís da Praça Mauá as delegações da Argentina, Chile e Uruguai, sendo recepcionados com entusiasmo e festa no Clube São Cristóvão. Após o desembarque os selecionados se hospedaram no Hotel dos Estrangeiros. Uma infelicidade, contudo, foi a morte do goleiro uruguaio Roberto Chery, falecido, ao que se sabe, em decorrência de uma apendicite aguda.

 
O SUDAMERICANO

 
 
A competição Sul-Americana era a maior conquista possível para a época. Somente 11 anos depois nasceria a Copa do Mundo e os países da América do Sul só começaram a participar do futebol em Jogos Olímpicos a partir de 1924. Como nas edições anteriores, o 3.º Campeonato Sudamericano teve a participação de quatro seleções e foi decidido em sistema de todos contra todos, tendo no caso de empate o jogo extra.
 

A expectativa e o entusiasmo gerado pela estreia do scratch brasileiro, dia 11 de maio, contra a representação Chilena, foi incrível. A comoção aquele dia mostrava a mudança do interesso do brasileiro pelo futebol. Mesmo com o acesso aos clubes sendo restrito aos integrantes da elite, tendo a classe popular proibição aos jogos e até mesmo ao gramado, o estádio das Laranjeiras ficou lotado. Nas arquibancadas só se observava torcedores & torcedoras elegantes (com chapéus, terno/gravata ou vestidos longos). Próximo ao estádio os morros também ficavam apinhados pelos menos favorecidos. Segundo o Jornal do Brasil “eram duas horas da tarde quando a bilheteria fechou. A enchente foi colossal”. Muitas pessoas, mesmo com ingressos, acabaram ficando de fora e isso causou protestos e tumultos, principalmente quando de acordo com a nota “O portão central também foi fechado”. Aqueles que conseguiram entrar, ainda segundo a matéria, “devido ao enorme aperto, passaram para o local da arquibancada aos pulos”.
 
 
Quando a bola rola o Brasil parece sentir a pressão inicial da estreia e os chilenos aproveitam para executar as primeiras ações com o avançado Alfredo France, obrigando boas defesas do goleiro Marcos Carneiro de Mendonça. Somente na troca de passes da linha média brasileira se faz acalmar os ânimos. Ao avanço de Arnaldo vem o ataque brasileiro, aos 19 min, o ponta-esquerda acha Friedenreich, que arremata forte e abre o placar (1x0), fazendo a emoção dos torcedores. A peleja fica aberta e, três minutos depois, Fried faz mais uma bela jogada e toca para Neco, sem marcação, fazer o segundo. Na zaga chilena destacava-se Ramón Unzaga, conhecido por fazer um movimento no ar com as costas paralelas ao chão para impedir o ataque dos oponentes, os torcedores e jornalistas chamavam de “chinlena”. Mas o back sofreu com as invertidas de Arnaldo, que fez outra boa jogada e passou para Friedenreich, o atacante então usa da costumeira habilidade e se livra da marcação para fuzilar o gol adversário! A primeira etapa se encerra 3x0 para os brasileiros.

Menos afoitos para sair jogando os chilenos preferem guarnecer a retaguarda na segunda fase, enquanto o Brasil não diminui o ritmo. Em um dos ataques brasileiros, aos 31’, após um bombardeio pra cima do goleiro chileno, Friedenreich aproveita e consegue marcar mais um. Pouco depois, Haroldo assinala nova contagem (5x0). Perto do fim, aos 38’ complementar, deu tempo para Neco fechar a goleada em 6 a 0! Muita emoção e festa nas arquibancadas pela incrível façanha brasileira, os aplausos tomaram conta do estádio quando o argentino Juan Pedro Barbera apitou o final do prélio. O povo que queria seu lugar, seu espaço na nação, começou a encontrar o futebol nessa dilatada contagem.

Dois dias depois, em um duelo bastante equilibrado, o atual Bicampeão Uruguai venceu a Argentina por 3x2.

No dia 18 de maio, outro mundaréu de gente tomou conta das arquibancadas das Laranjeiras desde o meio-dia, para a segunda apresentação brasileira. Mesmo com a boa apresentação ante o Chile, ocorreram algumas alterações do quadro nacional, com as entradas de Fortes, Millon e Heitor nos lugares de Gallo, Luiz Menezes e Haroldo. Pela frente os sempre habilidosos e aguerridos argentinos, que tinham como destaque o defensor Armando Reys, os meias Pedro Calomino, Martinez e Juan Perinetti, além dos goleadores Izaguirre e Edwin Clarcke. Noticiava-se que “A busca por um lugar naquela festa tornava-se um privilégio”, relatou o Jornal do Brasil. Com gente por todos os cantos, “a concorrência extra-muros também era colossal: o morro que fica numa das cabeceiras do estádio estava igualmente repleto; nele formigava uma multidão irriquieta que para ali se guindou à força de braço, fazendo verdadeiros prodígios de equilíbrio para não ser deslocada pelos retardatários. Na geral, parte castigada pelo sol, os assistentes comprimidos uns pelos outros, a chupar tangerina, jogando cascas sobre os que lhe ficavam por baixo, berravam pedindo o início do jogo” descreveu o jornal O Imparcial.

 
 
Sem se intimidar com a torcida brasileira e aplicando seu jogo de passes, os argentinos tentaram algumas vezes furar o trio final brasileiro Marcos-Píndaro-Bianco na base da técnica e da insistência, mas foram bem neutralizados. O Brasil não demorou a reagir, em ofensivas igualmente perigosas o goleiro Isola praticava defesas assombrosas. Se não havia predomínio de algum lado, os brasileiros ao menos eram mais perigosos. Passados os 20’, Millon cobrou escanteio, Fried cabeceou firme e Isola rebateu, Heitor encontrou condições e inapelável balançou o filó, fazendo a explosão da torcida brasileira em prumo delírio. Ainda com ímpeto os argentinos reagem com enorme pressão, e só não marcaram por encontrar Bianco, um gigante a transpor as iniciativas, mantendo a vantagem inicial brasileira.

A decorrência se insinuava para ambos os lados no recomeço da partida, sendo uma jogada argentina parada com incrível defesa do arqueiro brasileiro, definitivamente consagrado. No lance seguinte, aos 12’ do complementar Fried, Arnaldo e Neco fazem troca de gentilezas com passes curtos, Arnaldo manda o balão a meia cancha, o excepcional, Amílcar, domina e resolve experimentar dali mesmo o goleiro Isola, um petardo sensacional que furou as redes argentinas deixando a plateia boquiaberta. A resposta Argentina veio 8 minutos depois, Izaguirre passou por Píndaro e venceu o goleiro Marcos. Depois brilhou Bianco, soberano na defesa, impedindo a igualdade. Na vantagem o jogo finalmente fluiu para os brasileiros, após triangulação de Arnaldo com Friedenreich, a bola chega à Millon, que vence os marcadores na velocidade e atira o couro fazendo 3 a 1! “Consolidado o esplendido triunfo brasileiro, que apesar de belas jogadas ofensivas, teve Bianco convertendo-se no expoente máximo da partida” destacavam os jornais.

No dia 25 de maio de 1919, também no Estádio das Laranjeiras, o Uruguai venceu o Chile por 2 a 0, ficando na igualdade de pontos com os brasileiros. A seleção uruguaia era dotado dos grandes jogadores de Peñarol e Nacional, formando em sua base Alfredo Foglino, José Vanzzino, José Pérez, Héctor Scarone, Ángel Romano, Isabelino Gradín & outras feras. Eram os atuais Bicampeões continentais e favoritos para o Tricampeonato.

 

Assim, após às duas primeiras rodadas, brasileiros e uruguaios chegaram ao compromisso do dia 26 de maio pensando em destinar o título, no campo das Laranjeiras. Com apenas 20 minutos de jogo, os uruguaios fizeram valer seu favoritismo abrindo 2 a 0, com gols de Gradín (13’) e Scarone (aos 17’). O resultado deixava a gente brasileira, que transbordava o campo do Fluminense e o morro do Mundo Novo, tristonha e em verdadeiro tom de luto. O sonho parecia findado. Ainda na primeira fase, porém, um dos líderes do grupo, Manuel Nunes, o Neco, energizou os companheiros: "Não há de ser nada! Vamos lutar pelo Brasil, rapaziada! Vamos para cima do arco uruguaio". Mais que falar o herói brasileiro chamou a responsabilidade aos 29', venceu a defesa uruguaia e atirou sem chances para o guardião uruguaio Saporiti, que só olhou, Brasil 1x2! A segunda fase começa e aquela garra pedida por Neco fez fervilhar no sentimento dos patrícios, a equipe se lançou à frente enquanto os uruguaios recuavam. A apreensão tomava conta do estádio, quando novamente Neco (um dos artilheiros do torneio ao lado de Fried), desvencilhou o embrulhamento defensivo adversário e deferiu novo golpe vencendo a linha fatal do gol uruguaio, empatando  o cortejo (2x2)! Aquele tento foi heroico,  toda a gente brasileira voltou a sorrir novamente, nada estava perdido!

Nos arredores das grandes redações jornalísticas a emoção também foi grande, pessoas se reuniam para observar o placar exposto, as mudanças ocorrendo conforme ligavam para anunciar os gols. 

 
 
O Brasil jogava no 2-3-5, esquema tradicional da época. Por atuar com três jogadores que eram em essência atacantes e não propriamente meias, casos de Neco, Fried e Heitor, a criação se dava por meio da linha média com Amílcar e os pontas Millon e o capitão Arnaldo Silveira. O trio final (os defensores Píndaro & Bianco) pouco subia à frente e também tinha a proteção lateral de Sérgio e Fortes.

 

NASCE A PÁTRIA DE CHUTEIRAS 

Igualados em todos os contextos, teve de ser marcado um duelo desempate para desfecho do valor máximo, dia 29 de maio de 1919. A ocasião era um marco na história esportiva do Brasil e o governo decretou ponto facultativo em todas as repartições públicas, como bancos e casas de comércio, que ficaram fechados. A partida foi marcada para iniciar às 14 horas, mas a torcida brasileiro chegava ao Estádio das Laranjeiras desde às 9, abarrotando as arquibancadas do palco do desfecho. Os portões teriam sido fechados desde o meio-dia e o que se noticia eram torcedores dispostos a pagar qualquer quantia para assistir à finalíssima. A renda chegou aos 316 contos de réis, uma fortuna na época.
 

A partida se iniciou contida pelos selecionados e prevalecendo maior preocupação com a meta, as equipes pouco se digladiaram. As organizações buscavam o ataque de forma planejada, contendo a ansiedade e esperando um momento mais auspicioso, acabando por deixar os goleiros em estado de tranquilidade na primeira etapa. Ao retornarem ao campo veio às ações mais agressivas, trazendo as emoções que a primeira parte não dera. Com Romano a primeira chance mais clara, Gradin também tentou, mas ambos acabaram paralisados pelo agigantamento de Marcos Carneiro de Mendonça. Pelo lado brasileiro a torcida pôde se encher de ânimo com Heitor, em oportunidade ideal, mas não conseguiu vencer Saporiti. Os aficionados brasileiros ficam frustados no chute de Friedenreich, que acabou tendo muito capricho. Corria pelo meio-campo o truncamento e a partida uma batalha de espaços, se antes os olhares eram de ansiedade e entusiasmo, com a luta campal se transformavam em angustiante tensão. As retaguardas pareciam impenetráveis, quando ocorriam chances os goleiros se certificavam de brilhar, fazendo o empate permanecer.

Sem gols na peleja, mesmo sem permitir substituições, o regulamento previa das duas equipes jogarem quantas prorrogações fossem necessárias até se conhecer um vencedor. Assim, se seguiu a partida, em luta de disposição e estratégias, embora já se notasse o cansaço dos jogadores de ambos os lados. Os uruguaios que vieram certos de que regressar à sua pátria como vencedores do certame, por muito pouco não obtiveram a vitória com Scarone já no fim da prorrogação inicial, sozinho o avançado arrematou violentamente e esperou o gol certo, enquanto o dirigente uruguaio Héctor Gómez já comemorava. Á frente da meta, porém, o incrível Marcos, conhecido por usar uma fita roxa no calção, efetivou verdadeiro milagre para desespero dos uruguaios, incrédulos no lance! Anos mais tarde, Marcos diria ter sido a “defesa mais difícil e mais importante da sua carreira”. Aquele lance motivou os brasileiros a reagirem.
 
 
Foi necessário nova prorrogação, com o Brasil junto de sua gente formando uma disposição inquebrantável. Aos 7 minutos do quarto tempo extra, o valente Neco venceu a defesa uruguaia pela direita e cruzou centrando na área para Heitor. Em desespero o goleiro Saporiti socou a redonda com força para fora da área, mas a bola veio à feição de Friedenreich, que arrematou de primeira no canto direito do gol uruguaio! Brasil 1x0! Se ainda existiam forças para o Uruguai tentar alguma reação, pressionando os últimos momentos, cabia valentia aos brasileiros criando uma fortaleza impenetrável, principalmente com Marcos & Bianco. Scarone ainda quis arrumar briga com um torcedor, e Marcos ainda fez nova defesa magnífica parando Gradín. Até finalmente, depois de 150 minutos (o mais longo jogo da história da Copa América),  às 17h25, o grito de "É Campeão" pôde ecoar, com o apito final acabando a angustiante espera da torcida brasileira. A euforia foi enorme a partir daí, torcedores jogavam seus chapéus para o alto em celebração, jogadores se abraçavam emocionados. Não se sabia se choravam ou gritavam, a festa nas arquibancadas, do lado de fora do estádio, pela cidade do Rio de Janeiro, não teve mais hora de terminar. O autor do gol, o estupendo Friedenreich, foi o mais festejado, seguido do homem das defesas impossíveis, Marcos, ambos carregados nos braços do povo. Gestos que mostravam simbolicamente como aquela conquista unia as classes, pois, de um lado estava um mulato, e de outro um descendente de família rica da elite.
 
“O chute de Friedenreich abriu o caminho para a democratização do futebol brasileiro.”
- escreveu o jornalista Mário Filho, no livro "O negro no futebol brasileiro".

As comemorações seguiam no centro da então capital federal (o local dos grandes acontecimentos), pela Avenida Rio Branco, espaço ao qual o povo acompanhou o jogo de frente as redações jornalísticas. Aos poucos, foi sendo assimilada a informação do inédito e monumental feito por todo o país, com ampla divulgação nos principais jornais e revistas da época, também em filmagens emocionantes, com multidões que lotaram as salas de projeção em Belo Horizonte e outras cidades. O futebol virava parte do brasileiro e o brasileiro passava a ver o futebol como sua representação social. Aquela conquista inspiraria poesia, virou musica na versão de um jovem com apenas 22 anos, chamado Alfredo da Rocha Viana, o grande Pixinguinha, que acompanhou nos arredores das redações. Em 1917, ele já havia composto o choro “Carinhoso”, clássicos da Música Popular Brasileira. Com a felicidade da conquista veio a composição de outro dos seus choros mais famosos: “Um a zero”, em parceria com Benedito Lacerda. A obra ganharia letra somente nos anos 1930, sendo gravada por Orlando Silva, o “cantor das multidões”, para a consagração de vez ao compositor.
 
Vai começar o futebol, pois é,
Com muita garra e emoção
São onze de cá, onze de lá
E o bate-bola do meu coração
É a bola, é a bola, é a bola,
É a bola e o gol!
Numa jogada emocionante
O nosso time venceu por um a zero
E a torcida vibrou (...)!!!

A epopeia de conquistar o Campeonato Sul-Americano de 1919 foi a gênese da paixão do povo brasileiro pelo futebol. Vivenciando um ambiente marcado por injustiças sociais e politicas, a população se identificou e encontrou sua representação na vitória do Brasil. Aquela equipe era formada por jogadores de diferentes perfis, tanto pela cor da pele como a posição na classe social. Era o retrato de uma nação mais igualitária, pluralizada, que gerou na sociedade brasileira um sentimento de orgulho pleno. Se antes o brasileiro se via como um miserável, era tratado assim pelos próprios governantes, encontrou nessa mistura de brancos, mestiços e negros com a bola nos pés uma forma de ter sua representação triunfal. Nascia assim, definitivamente, A Pátria de Chuteiras!
 
CONQUISTAS & DESEMPENHOS
- Campeonato Sul-Americano de Seleções (A Copa América) de 1919.

FAÇANHAS & LEGADO
- A conquista transformou o futebol numa representatividade cultural do povo Brasileiro.

FONTES/REFERENCIAS:
Jornais do Brasil, Mundo Esportivo, Correio Paulistano, O Imparcial;
Arquivos Nacional (CBF);
Descrição dos Gols de Neco com ajuda de Maurício Sabará (autor do Livro Generalissimo Amílcar Barbuy);
Livros referencias “O Negro no Futebol Brasileiro” (Mário Filho) e “Sul-Americano de 1919: Quando o Brasil Descobriu o Futebol” (Roberto Sander).